sábado, 4 de dezembro de 2010

HOMENAGEM: MANOEL DE BARROS (BRASIL)




Foto: Bandeira do Brasil




Foto: o poeta Manoel de Barros (Brasil)






V


Escrever nem uma coisa
Nem outra -
A fim de dizer todas -
Ou, pelo meno, nenhumas.


Assim,
Ao poeta faz bem
Desexplicar-
Tanto quanto escurecer acende os vagalumes.



( In: O Guardador de Águas,MANOEL DE BARROS,3ª ed.,Record, 2003, p.61)




8

Uma chuva é íntima
Se o homem a vê de uma parede umedecida de moscas.
Se aparecem besouros nas folhagens;
Se as lagartixas se fixam nos espelhos;
Se as cigarras se perdem de amor pelas árvores;
E o escuro se umedeça em nosso corpo.


(In: O Guardador de Águas, MANOEL DE BARROS, 3ª ed., Record, 2003, p.47)


VIII


Nas Metamorfoses, em duzentas e quarenta fábulas,
Ovídio mostra seres humanos transformados em
pedras, vegetais, bichos, coisas.
Um novo estágio seria que os entes já transformados
falassem um dialeto coisal, larval, pedral, etc.
Nasceria uma linguagem madruguenta, adâmica,
edênica, inaugural-
Que os poetas aprenderiam - desde que voltassem às
crianças que foram
Às rãs que foram
Às pedras que foram.
Para voltar à infância, os poetas precisariam também de
reaprender a errar a língua.
Mas esse é um convite à ignorância? A enfiar o idioma
nos mosquitos?
Seria uma demência peregrina.


( In: O Guardador de Águas, MANOEL DE BARROS, 3ª ed., Record, 2003, p.64)




*MANOEL DE BARROS: nasceu no Beco da Marinha, beira do Rio Cuiabá(MT) em 19 de dezembro de 1916. Mudou-se para Corumbá, onde se fixou de tal forma que chegou a ser considerado corumbaense. Atualmente mora em Campo Grande. É advogado, fazendeiro e poeta. Escreveu seu primeiro poema aos 19 anos, mas sua revelação poética ocorreu aos 13 anos de idade quando ainda estudava no Colégio São José dos Irmãos Maristas, Rio de Janeiro. Autor de várias obras pelas quais recebeu prêmios como o "Prêmio Orlando Dantas" em 1960, conferido pela Academia Brasileira de Letras ao livro "Compêndio para Uso dos Pássaros". Em 1969 recebeu o Prêmio da Fundação Cultural do Distrito Federal pela obra "Gramática Expositiva do Chão" e, em 1997 o "Livro Sobre Nada" recebeu um prêmio de âmbito nacional.



Obras
1937 - Poemas concebidos sem pecado
1942 - Face Imóvel
1956 - Poesia
1960 - Compêndio para Uso dos Pássaros
1966 - Gramática Expositiva do Chão
1974 - Matéria de Poesia
1982 - Arranjos para Assobio
1985 - Livro de Pré Coisas
1989 - O Guardador das Águas
1991 - Concerto a Céu Aberto para Solos de Aves
1993 — O livro das ignorãças

1996 — Livro sobre nada (Ilustrações de Wega Nery)

1998 — Retrato do artista quando coisa (Ilustrações de Millôr Fernandes)

1999 — Exercícios de ser criança

2000 — Ensaios fotográficos

2001 — O fazedor de amanhecer (infantil)

2001 — Poeminhas pescados numa fala de João

2001 — Tratado geral das grandezas do ínfimo (Ilustrações de Martha Barros)

2003 — Memórias inventadas (A infância) (Ilustrações de Martha Barros)

2003 — Cantigas para um passarinho à toa

2004 — Poemas rupestres (Ilustrações de Martha Barros)

2005 — Memórias inventadas II (A segunda infância) (Ilustrações de Martha Barros)

2007 — Memórias inventadas III (A terceira infância) (Ilustrações de Martha Barros)